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quinta-feira, 17 de maio de 2012

Falar da morte à criança faz parte da vida (Crescer conm Vida a superar as perdas)

Falar da morte à criança faz parte da vida (Crescer conVida a superar as perdas)
Por Rita Jonet, psicóloga no colégio O Nosso Jardim e Professora na ESEI Maria Ulrich

“Aprender a aceitar a morte é uma das lições mais importantes que uma criança tem de aprender na vida”, começo por citar Brenda Mallon e aconselho o seu livro revelador: “Ajudar as crianças a ultrapassar as perdas, estratégias de Renovação e Crescimento”.

Preocupo-me com o fato de muitos pais e Educadores tenderem a ignorar este tema. Tenho acompanhado centenas de crianças e constato uma enorme resistência a encarar a morte e os sentimentos de perda. O assunto geralmente é tabu, o recalcamento impera o que gera insegurança e angústia. Esta resistência baseia-se na dificuldade crescente das crianças em lidarem com qualquer frustração, sendo a morte a pior de todas.
Os pais têm tendência a superproteger, a facilitar em demasia a vida dos filhos pois sentem-se culpabilizados pela pouca disponibilidade que têm e porque vêem o mundo cheio de dificuldades. Acreditam na necessidade de os proteger do desgosto, pensam ser a melhor forma de educar. Segundo Brazelton (pediatra de referência) “não podemos nem devemos proteger os nossos filhos de uma identificação profunda e afectuosa com aqueles que sofrem uma grande perda, nem podemos evitar o seu próprio desgosto. Este constitui uma parte vital e inevitável da vida. Sentir saudades de alguém que desapareceu, temporária ou permanentemente, permite à criança aumentar a sua capacidade de se preocupar com os outros.”
Antigamente as crianças assistiam e participavam nos rituais e tradições ligados à morte. Por vezes presenciavam situações chocantes e ninguém questionava até que ponto as poderiam traumatizar. Desde que se começou a estudar o desenvolvimento psicológico da criança, aumentou a consciência de a preservar de situações que não é capaz de compreender e que lhe podem causar sequelas. Esta consciencialização tem tido como consequência uma atitude radicalmente oposta: a morte faz parte das palavras não ditas, dos tabus.
As crianças estão cada vez mais à margem, sendo excluídas desta experiência para que não sofram. Este evitamento é tanto maior quanto mais os adultos têm dificuldade em encarar a morte.
Deste modo cria-se uma situação irreal: não se fala nem se vive a morte como fazendo parte da vida!
Evita-se a todo o custo este assunto, chegando-se ao ponto de nada dizer à criança mesmo quando morre uma pessoa próxima. Tenta-se ignorar ou, então, perante as suas questões insistentes, diz-se que essa pessoa foi para longe, viajou, desapareceu, ou outras respostas igualmente evasivas. Assim se vai adiando o problema.
Brazelton assegura: “para a criança é melhor compreender a morte através do próprio desgosto dos pais do que sentir o afastamento deles sem entender a razão para isso. Para uma criança a noção de morte é muito diferente da de um adulto. Tem tendência a equipará-la com a sensação de ficar sozinha ou abandonada. Se os pais se alhearem sem compartilharem a experiência por que estão a passar, isto confirmará os piores receios da criança.”

É essencial a criança encarar a morte como fazendo parte da vida!
Deverá ser preservada de cenas ou ritos chocantes, que excedam a sua capacidade de compreensão, mas é sempre mais saudável e natural quando a criança vive, em família, o desgosto e o luto participando nos tradicionais rituais de despedida. Assim, aprende a lidar com a tristeza, descobre o sentido de chorar em família, a força da união e o consolo subjacente (as lágrimas ajudam a ultrapassar, a sarar, são catárticas). A criança vive a perda amparada afectivamente e na altura própria em vez de ser posta à margem ficando numa situação indefinida que só causa maior confusão, medo, instabilidade e angústia. Desta forma poderá fazer o luto - depois da fase aguda, do choque e da desorganização será possível a renovação.
A superação da perda depende, também, da experiência de que é aceitável expressar sentimentos - quanto melhor os pais exteriorizarem e verbalizarem as suas emoções maior capacidade os filhos terão. Os educadores são modelos muito poderosos de expressão emocional
Entre os três e os seis anos a criança tem, com frequência, tendência para se sentir culpada da morte de algum ente querido. Para Brazelton “a criança precisa de ouvir repetidamente que o facto de ser “mau” não traz retaliações, e que os maus pensamentos não fazem com que as pessoas morram.” A morte é a negação da vida e, como tal, será sempre difícil de aceitar. A reacção mais primária é evitar encará-la. No entanto, esta fuga não é construtiva - só aprendemos a lidar com a morte se a conseguirmos enfrentar, se formos aprendendo que ela é tão natural como a vida.
Sentir os desgostos alheios e, nessa altura, ser solidário é, de algum modo, uma forma de preparação para as suas próprias perdas. Mas a preparação começa muito antes, com a aprendizagem das “pequenas mortes” que acontecem ao longo da vida: as flores; as borboletas; os animais de estimação; as pessoas distantes, que partem para longe e deixam saudades; o adiamento da gratificação ou sempre que somos capazes de prescindir de algo e nos superamos. Todas estas experiências e muitas outras podem fortalecer pois o sofrimento também faz parte da verdade da nossa vida. Outra forma de preparação é a temática de numerosos filmes e livros para a infância onde a morte, a perda e o abandono surgem como assuntos centrais. Não é por acaso que a oferta é imensa - este tema vai ao encontro das questões mais profundas da criança. Aqui ficam alguns exemplos de filmes e de livros: O Rei Leão; Peter Pan; Bambi; A Bela Adormecida; Branca de Neve; Babar; Nemo; A Idade do Gelo; etc. É importante estar com a criança e ajudá-la a gerir as emoções ao identificar-se com os personagens.
Concluindo… Se as crianças viverem em família, bem amparadas, o drama de perderem algum ente querido e sentirem que, apesar do sofrimento vivido (tristeza, saudade, zanga, maior ou menor aceitação) a vida continua, então aprendem uma lição essencial: a morte faz parte da vida!
“A maturidade e o crescimento passam pela aceitação de que as lições de vida nem sempre são fáceis de aprender.” Brenda Mallon

Estratégias a seguir
Aqui ficam algumas estratégias para a renovação e crescimento propostas por Brenda Mallon: Informações claras - dependentes da maturidade, sensibilidade e proximidade; Rituais de passagem – funeral, missa; Caixa de recordações; Escuta activa – ouvir incondicionalmente; Protecção – amor, apoio, segurança; Respeito; Desenvolver a auto-confiança – a criança que é valorizada aprende a valorizar-se.

Evolução
A forma como a criança encara a morte vai evoluindo com o desenvolvimento:
Dos 3 aos 5 anos. Pensamento Mágico (Egocêntrico) – morte = sono = longa viagem – implica um acordar ou regressar.
Por volta dos 5 anos. Intensifica-se o medo da morte - ansiedade de separação.
Dos 6 aos 10 anos. Crianças intrigadas com a morte – a morte é real mas evitam imaginar que as pode tocar.

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